segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Vagalumes.

Estávamos em casa os três. Eu, na paz da minha leitura, eles dois jogando xadrez no quarto, até que o Marcos por mim chama, com uma ânsia de quem não quer deixar de compartilhar na voz: "rápido, rápido, vem ver", respondi que não queria, mas então Eduardo intercedeu dizendo, igualmente ansioso: "vem logo, você vai perder". Fechei o livro com calma, tirei meus óculos, apoiei-o, junto com o livro, na nossa mesinha de abóbora, ajeitei meu vestido e fui andando sem pressa, enquanto eles, cada vez mais ansiosos chamavam: "anda, anda", em coro. Chegando lá: um vagalume! Sim, um vagalume! E um vagalume verde, que, provavelmente se eu parasse para pensar um segundo, notaria que era, de longe, meu preferido. Verde é a cor da esperança, esperança essa que todos nós precisávamos naquelas épocas.. Abri um sorriso incrivelmente encantado e infantil, então eles puderam notar que obviamente um vagalume, para mim, não era só um vagalume, e eu pude notar que, para eles, importava muito que eu me importasse. Fechamos as janelas. Parece crueldade, dizendo assim, mas queríamos apreciar aquela beleza brilhante, só mais um pouquinho.. Deitamos na nossa cama tripla como se fossemos desabafar sobre um novo amor, olhando pra cima, enquanto ele dançava, evidentemente vaidoso. Ficamos assim, de mãos dadas, sorrisos atordoados nos rostos e olhos atentos por alguns minutos, quando aconteceu.. Eu esqueci de mencionar que esse vagalume cor de esperança surgiu na nossa casa em tempos de guerra. Marcos e Eduardo foram dispensados do alistamento por problemas de saúde física e mental, respectivamente. Então mais uma vez pudemos ficar juntos, nós sempre ficamos, sempre ficaríamos, se não fosse por toda aquela luz.. Aquela maldita luz que me persegue ainda hoje, tantos anos depois nos meus sonhos, a agressiva luz que de uma vez só levou os dois únicos homens que eu poderia amar e que me amaram e se amaram com a doçura de céu outonal. Com a beleza de um borboletear de um vagalume a luz se foi, ficou o pó e o sangue, nenhuma luzinha verde esperança se exibindo no quarto, nenhum quarto. É tudo que me permito lembrar daquele dia. Agora aqui, no lugar que me colocaram, não há vagalumes, claro que não, se estou num lugar que não há janelas, por onde eles entrariam? Eu já pedi, implorei, até chorar eu já chorei: "Se eles não podem vir espontâneamente, traz-me um vagalume?". Mas os homens por aqui são muito diferentes. Eles não me amam, não se amam e acredito que não queiram o bem de ninguém. Além disso estão sempre a fingir sorrisos esquivos e sarcásticos, que mais parecem um lamento. E com esses mesmos sorrisos de dor nos lábios é que sempre respondem a mesma coisa ao meu pedido: "sem vagalumes pra louquinha". Sabe? Antes das negações seguidas da palavra "louquinha" eu amava diminutivos, agora odeio-os, porque qualquer um deles me lembra que continuarei aqui, presa, sem saber porque e pior que qualquer coisa, sem eles ou meus vagalumes.

2 comentários:

Erica Vittorazzi disse...

ah, sempre haverá vagalumes. Se não, poderá haver formigas... Podemos mudar a esperança de lugar. Isso não é esperançoso?

Ferdi disse...

Esperançossíssimo, de fato!
Pena que talvez ela não tivesse condições de cultivar outras esperanças.